Acabei de assistir "Paperman" um curta metragem da Disney/Pixar, indicado ao Oscar e, pelo que estava lendo, o curta utiliza de uma nova tecnologia, que parece inédita nos filmes de animação. Mas apesar da técnica, dos traços do desenho serem belos, a história é simplesmente linda. Num dia qualquer, duas pessoas se encontram numa cidade grande e por conta de um fato cômico, uma ligação acontece. São aviões de papeis que levaram ao reencontro, que levaram o rapaz a "moça dos seus sonhos".
E do que são capazes os papeis, me lembrei de um fato não tão romântico, mas tão consolador que aconteceu comigo anos atrás. Quando morávamos numa republica, na época em que estudávamos, eu vivia uma fase Renoir. Eu pintava telas nas horas vagas das leituras de Marx, mas nunca tive o cuidado de guardar as minhas tintas, e as deixava numa sacolinha de supermercado, guardadas próximas a minha cama. E foi num dia qualquer, que uma mulher se ofereceu pra fazer uma faxina, era conhecida de todos os estudantes e a faxina completa nos pouparia horas de esforço. Aceitamos! Após a faxina feita, a casa brilhava... tudo em seu devido lugar. Fui terminar um quadro, que me renderia um dinheirinho para uma cerveja com as amigas, mas aonde estavam as tintas? Cadê as tintas? Mas como poderiam desaparecer? Não as encontrei, não fiquei com raiva, apenas me senti abandonada, foi quando uma das meninas que moravam comigo e, com grande espírito curioso foi até a rua, bisbilhotar no saco de lixo. Em meio a poeira, cabelos e embalagens vazias, lá estavam as minhas tintas, amassadas, apertadas, machucadas...
Fui dormir e quando acordei havia em cima da cama, um pequeno papel com os seguintes dizeres: "O que são capazes os brutos, levam o sol, a lua e levam as tintas, mas não se preocupe, sua vida é cheia de cores"
Era um bilhete da minha sensível amiga Patrícia, que jamais esqueci e que guardo até hoje comigo.
Do que são capazes os papeis? eles me lembram que a minha mãe me ama e que eu preciso dar comida para os meus cães (mamãe tem o hábito, de sempre me deixar bilhetes). Amo também, o papel da conta de telefone, onde meu pai escreveu certa vez - "Tati, vá calibrar os pneus antes de sair com o carro".
As cartas de amor, trocadas com um namorado de Minas Gerais, os cartões de natal dos amigos que já nem se encontram mais aqui. O cartão musical que não havia nada escrito, as letras tortuosas do meu avô Benedito dizendo que me amava num desses cadernos de recordações. As covardes despedidas, pedidos de dinheiro e desculpas. Os papeis são capazes de nos conduzir, acalentar, sentir raiva e amar. Sou cercada de papeis especiais guardados numa caixa velha... quando quero me reencontrar, vou até eles, pois a minha vida é cheia de cores.
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