Sozinha, nas noites de melancólia, mas de calor intenso, o suor escorria pelos seus cabelos, deixava-se abraçar pelas recordações. Detinha a pensar nos pais rígidos e de que nunca pudera ir a um baile. Ajudava a mãe na costura, alinhavava e bordava os vestidos, sorria para as moças que experimentavam e ouvia tudo, alfinetando ora uma bainha, ora seu dedo, por falta de atenção. Como sonhava entrar no salão, dançar e se sentir cortejada. Mas sua vida se resumia ao único passeio que o pai consentia, a matinê do cinema lá no centro da cidade. Era um ritual sagrado, tomava um banho, se perfumava com a água de laranjeira e vestia-se com seu mais bonito vestido, o estampado de florzinhas amarelas. Então, sentava na soleira da porta a esperar pela tia velha.
Lembrava então do moço de bigode, que sempre esperava por elas na porta do cinema e sempre tentava puxar conversa. A cidade inteira não gostava dele, pois o moço tinha uma ideias bem diferentes dos outros da cidade. Ele até que tentou uma aproximação com bilhetes, estava disposto a conversar com o pai. Mas logo ela soube que o moço partira pra longe, atrás das tais ideias revolucionárias, sem ao menos dizer adeus. Mais velha, já com a mãe doente, sua vida era a máquina de costura. Tinha orgulho dos modelos confeccionados por ela. Um pedaço dela ia aos bailes - seus vestidos.
O tempo foi passando, outros se aproximaram, mas não ficaram. A maioria deixava a moça que já estava ficando velha, com os olhos vermelhos de tanto chorar. Perdeu os pais, perdeu a juventude e só lhe restava os filmes para acalentar o coração que vivia em soluços. Já velha, numa dessas noites de calor intenso, com os cabelos presos de tanto suor, ela viu pela janela um brilho que não parecia de estrela.
Aquele luminosidade ia crescendo e se aproximando da janela. E por incrível que pareça, ela não teve medo. A luz entocava uma canção e, ao se aproximar, estendeu sua mão luminosa e a moça que era de carne e osso como eu e você, saiu pela janela, voando, voando com a luz e nunca mais apareceu.
Eu sei e você sabe, já que a vida quis assim
Que nada nesse mundo levará você de mim
Eu sei e você sabe que a distância não existe
Que todo grande amor
Só é bem grande se for triste
Por isso, meu amor
Não tenha medo de sofrer
Que todos os caminhos me encaminham pra você
Assim como o oceano
Só é belo com luar
Assim como a canção
Só tem razão se se cantar
Assim como uma nuvem
Só acontece se chover
Assim como o poeta
Só é grande se sofrer
Assim como viver
Sem ter amor não é viver
Não há você sem mim
E eu não existo sem você
Suas linhas além de costurar os vestidos da personagem, bordaram um ardor em meu peito. Linha esta feita de algodão ou de palavras, esta linha não costura apenas tecido, mas também sentimentos em nossas almas.
ResponderExcluirParabéns.