Outro dia fui convidada por uma amiga para contar uma história de amor, em comemoração ao aniversário de casamento de seus pais. Ela me forneceu um resumo sobre como o casal havia se conhecido, e me permiti ali, naquela história recriar aquele dia novamente. Toda história de amor merece ser contada, com detalhes, com encantamento, mesmo que ela não seja uma grande aventura, ou que o amor não tenha sido proibido. Esse casal se conheceu no colégio onde estudavam... a menina alguns anos mais nova. O menino encantando e muito tímido, deixava bilhetes pelos corredores, e os bilhetes eram enigmas, que levavam a seguir trilhas e foi por esses caminhos que ambos se beijaram pela primeira vez, embaixo de um pé de laranjeira. Nesse momento, fizeram um pacto... ficariam juntos para sempre... e assim comemoram a cada ano, aquela brisa vinda da laranjeira a revelar o amor.
Conheço muitas histórias de amor, e faço questão quando conheço um casal com muitos anos de casados, de perguntar como se conheceram? A história que vou contar agora quem me contou foi o Rubem Alves, eu a acho uma das histórias de amor mais lindas de todos os tempos. Vou contar aqui uma versão resumida, mas se quiserem ler na íntegra acessem o site do autor, ou o site Aprendiz.
Menino, ele de longe olhava o mar, os barcos levados pelo vento. Pensava que o mar não tem fim. Pensava na felicidade dos pescadores que não tinham que plantar peixes, mas sim, só colher em suas redes. O mar era generoso. Ele era filho de agricultores, diferente do mar, a terra tinha fim. Todos os pedaços de terra, por mais insignificantes que eram já haviam sido cultivados. A terra chegara ao fim, quem quisesse mais terra para cultivar teria que sair em busca de terras desconhecidas, além do mar sem fim.
Ele ouvia as pessoas falando de outra terra, do outro lado, com costumes e povos diferentes, mas a terra era um segredo que ele conhecia, e foi assim que adolescente, junto com seus pais e irmãos chegaram ao Brasil.
No Brasil, o jovem conseguiu emprego de jardineiro, numa casa de alemães. Uma família muito rica, casa com muitos criados, ele não falava português e nem alemão, mas não importava, seu trabalho era cuidar da horta e do jardim. E a língua da terra ele conhecia muito bem, verduras frescas, arbustos artisticamente podados, canteiros explodindo de flores e foi assim que ele passou a ser amado por seus patrões.
mas ninguém, nem de longe suspeitava os sonhos na alma daquele jardineiro. Era sonho de amor, ele amava uma mulher, uma serviçal alemãzinha que todos a tratavam como Fraulein. Cabelos cor de cobre, pele salpicada de pintas, olhos azuis e um discreto sorriso. Ela era que lhe trazia o prato de comida todos os dias, com o mesmo sorriso.
E ele sonhava...sonhava o sonho dos apaixonados.
mas era um sonho, seu corpo atarracado, roupas sujas, mãos e dedos ásperos como pedra. Fraulein pertencia a um outro mundo, bem distante do seu.
Vez por outra ele oferecia uma flor, ela agradecia e voltava saltitante para casa, mas seu amor nunca saiu da fantasia.
os anos se passaram, ele ficou velho, Fraulein também envelheceu, mas o amor não diminuiu. O amor não satisfeito ignora a passagem do tempo, é eterno.
Chegou o momento em que ele bem velho, já não dava conta do trabalho, seus patrões que o amavam pensaram que o melhor e que ele passasse seus últimos anos num lar de japoneses idosos, com bonsais e tilápias num lago. Ele concordou, visitou o lar e por razões desconhecidas não quis viver lá, decidiu viver com parentes no interior.
Um dia movido pela saudade, resolveu visitar a casa onde passara toda a sua vida e onde vivia Fraulein, foi lá que lhe contaram que ela havia sido internada num lar para idosos alemães. Estava muito doente, foi então visitá-la. Encontrou-a numa cama, muito fraca, incapaz de andar.
E então ele resolveu ficar com ela. Passou a dormir ao seu lado, no chão, passou a cuidar dela, como se cuida de uma criança. A Fraulein estava muito fraca e não conseguia comer. Aconteceu então, um ato inacreditável de amor, que só os apaixonados compreenderão: o jardineiro passou a mastigar a comida que ele então colocava na boca da sua agora Fraulein. Os dirigentes da casa, fizeram de conta que nada viam.
Ele encostava seus lábios nos lábios de Frauleim, e assim lhe dava de comer, assim, como muitos namorados apaixonados fazem, e assim, no final da vida o jardineiro beijou Fraulein como nunca imaginara beijar... O amor se realiza de formas inesperadas.
Obrigada ao querido Rubem Alves, por ter me contado essa história, que dedico hoje a uma amiga especial... principalmente a frase: "O amor não satisfeito ignora a passagem do tempo, é eterno"
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